quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Cacique Juvenal Payayá na I Conferência Nacional Indigenista (Brasil).



I CONFERENCIA NACIONAL INDIGENISTA
Brasília 13 a 18 de dezembro de 2015

Inicialmente, como delegado da I CNI, procurei entender e neste texto vou tentando expressar a opinião do que vi e senti, concluindo de antemão  que, mesmo podendo fazer mais do que fizemos, demos passos seguros para o futuro dos  povos e nações  indígenas do Brasil

Apesar da gestão oficial a I CNI foi dominada pelas lideranças indígenas de todo o Brasil e o que deixamos de fazer não pode ser creditado a conta do acaso. 

Notei, porém, que fizemos aquilo que os ancestrais determinaram o que pudemos fazer. Os presentes, em volta de 1400 indígenas, trazendo suas maiores lideranças, caciques, pajés, direção de respeitosas entidades indígenas em todos os limites geográficos do país; a presença das esferas de governo, observadores, convidados e interessados, alguns em busca de informações e outros de afirmação.

Eram diversos povos em um só povo deixando claro, que, 500 anos depois todos sentem as opressões veladas, algumas semelhantes ao momento inicial do colonialismo, da colonização europeia que transformou o grande território indígena em uma nação que se diz formada por um “povo novo” cuja expressão nada mais é, quando se contempla o espelho, que o fruto do ventre das mães matrizes indígenas que desejam excluir.
O clamor pelo direito às suas terras, terras dos povos indígenas, foi o eco que mais soou como o badalar de sinos, som que o parlamento não quer ouvir, preferindo desmantelar o direito constitucional, pétreo, mas, direito para quem o tem não o negocia, luta-se por ele; essa é a disposição que ficou patente. 

As palavras indígenas durante a conferência foram revelantes, primeiro o que entendemos por ser Indígena: índio é raça, é nascimento, é identidade cultural, é sangue e seu passado é a oralidade histórica e a grafia histórica uma nota auxiliar; entende  seus direitos como nato, ancestrais [apyá paguama], consuetudinário, e na atualidade o direito constitucional e internacional; seu domínio limita-se às marcas deixadas pela ancestralidade indígena, de norte a sul.

Diversas foram as denuncias em que as mais objetivas reivindicações recaem para serem julgadas nos tribunais por leis das quais não fizemos e nem fomos consultados, interpretadas de forma precisamente ardilosas, sutis, tendenciosas, a partir da aberração dos marcos regulatório (o judiciário aponta o ano 1988 e não 1500 como data limite para a presença indígena em suas terras). 

A conferência clamou contra a famigerada PEC 215, uma espécie de lei do retrocesso, [mibaê mondá] da escravidão; o direito à língua materna, direito à saúde integral, o direito de ir e vir, a auto representação; a educação diferenciada, em sua língua e sobre seus costumes; além de combater o preconceito velado e a descaracterização dos órgãos públicos criados para atender aos indígenas nas suas peculiaridades, tais como a FUNAI/SESAI (saúde indígena),  assim como saiu em defesa da democracia, clamando contra ameaças de golpe contra a pátria. 

A I Conferencia, se não deu conta de tudo, propôs em um documento denso e de difícil leitura (115 propostas), senão para os muito interessados, os anseios dos povos indígenas pela sua auto determinação, desde o desejo prioritário, os maiores entre eles, que são a vida e a posse territorial,  até o mais simples, o  poder andar livremente pelas ruas vestido nas sua indumentárias sem dar explicações a quem quer que se diga autoridade. 

A I Conferência Nacional Indigenista venceu uma etapa, daqui a quatro anos teremos outra, talvez a I Conferencia Nacional INDÍGENA que deverá se auto-organizar e julgar, e certamente julgará os resultados práticos, avanços ou retrocessos, dos mais de mil delegados que durante quatro dias ausentes de seus problemas particulares e imediatos, próprios em cada aldeya  para projetar neste documento o futuro, o futuro da raça indígena, tão desejosa de sobreviver, com dignidade e com liberdade e auto determinação em seu território sagrado.

Juvenal Teodoro Payayá - Cacique Payayá e Delegado da I CNI 
Cabeceira do Rio (Yapyra) Chapada Diamantina – BA.

Fonte: Grupo Literatura Indígena. Acesso em 31.12.2015 

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