quinta-feira, 29 de maio de 2014

Honrando esteiras e porcos

Pílulas Diárias - 28/05/2014 - Sérgio Domingues

No momento em que nossos indígenas sofrem terríveis ataques a seus direitos, seria bom lembrar um livro chamado “O Papalagui”, de 1920. Trata-se da tradução feita pelo alemão Erich Scheurmann dos pensamentos de Tuiávii, chefe da comunidade da ilha de Upolu, em Samoa, na Polinésia.

“Papalagui” em samoano quer dizer “homem branco” ou “europeu”. Tuiávii admira os prodígios de que são capazes os brancos. Mas também enxerga neles “loucos furiosos”. “Eles se matam”, diz ele. “O sangue, o pavor, a destruição reinam”.

Em um de seus comentários mais interessantes, o líder samoano diz:

A palmeira deixa cair as folhas e frutos que estão maduros. Mas o Papalagui vive como se a palmeira quisesse retê-los. "São meus! Não os tereis! Jamais deles comereis!" Mas como faria então a palmeira para dar novos frutos? A palmeira é muito mais sábia do que o Papalagui.

Também entre nós existem muitos que possuem mais do que outros. É certo também que honramos o nosso chefe que tem muitas esteiras, muitos porcos, mas é só a ele que honramos, e não às esteiras e aos porcos. Estas coisas fomos nós mesmos que lhe demos de presente, como alofa [retribuição], para mostrar-lhe o nosso contentamento, para louvar a sua grande coragem, a sua grande inteligência. Mas o Papalagui o que honra são as esteiras e os porcos em quantidade que seu irmão possui; pouco lhe importa sua coragem ou sua inteligência. O irmão que não tem esteiras nem porcos, poucas honras recebe, ou não recebe honra alguma.

Somos assim. Desonramos pessoas e sua dignidade. Honramos esteiras vermelhas por onde desfilam porcos engravatados.

Fonte: Enviado por e-mail ao Grupo da RCPT. 

Carta Aberta da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena sobre os TEEs

Carta Aberta da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena sobre a implementação dos Territórios Etnoeducacionais

A Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena (CNEEI), reunida em sua 1ª reunião ordinária, nos dias 27 e 28 de maio de 2014, tendo como pauta principal a avaliação dos Territórios Etnoeducacionais, no marco dos 5 anos de publicação do Decreto 6861/2009 que institui os TEEs para a gestão da educação escolar indígena, constata que há previsão de 41 TEEs em diferentes etapas do processo de implementação, sendo que apenas 60% (24 TEEs) já estão pactuados. Tendo sido os primeiros TEEs pactuados em 2009, a CNEEI reconhece que já há experiência suficiente para uma avaliação da operacionalização das ações previstas no Decreto 6861/2009, para a proposição de encaminhamentos para a efetivação deste novo modelo de organização da educação escolar indígena e para a superação dos problemas e dificuldades estruturais diagnosticadas, conforme apresentado a seguir.

Considerando que:
O modelo dos Territórios Etnoeducacionais trouxe a esperança de um novo desenho para a educação escolar indígena com respeito às diferenças culturais, históricas e sociais destas populações;
Os TEEs representam um instrumento inovador para a gestão da educação escolar indígena, que pode constituir um avanço frente aos impasses criados pelo Pacto Federativo na oferta da educação escolar indígena;
Os TEEs representam a possibilidade de organizar a educação escolar indígena a partir da articulação dos povos, sua territorialidade, rompendo com os limites políticos administrativos dos Estados e Municípios;
Os TEEs representam uma instância de controle social, garantindo espaços para a participação indígena na tomada de decisões sobre a política e implementação da educação escolar indígena;
A instituição de uma Comissão Gestora em cada TEE  e apoio para a criação e/ou fortalecimento das instâncias já criadas no âmbito dos territórios possibilita o fortalecimento do controle social sobre a Política Nacional de Educação Escolar Indígena;
Os TEEs permitem o fortalecimento do Regime de Colaboração entre os atores no campo da educação escolar indígena, com ações partilhadas e pactuadas entre diferentes  instituições e povos indígenas;
O processo de implantação dos TEEs produziu dados e evidenciou diversos problemas enfrentados pelas comunidades indígenas para terem uma educação de qualidade em seus territórios.

Avaliando que:
Os TEEs não se tornaram unidades executoras, mantendo as deficiências de implementação e baixa execução das ações do PAR destinadas às comunidades indígenas;
O MEC não se estruturou administrativamente para exercer o papel de coordenador dos TEEs tal como dispõe o Decreto 6.861/2009, não contando com equipe técnica suficiente para os desafios colocados pela nova política que prevê ações de planejamento, acompanhamento e avaliação dos territórios;
A contratação de consultores não é a resposta administrativa adequada para a implantação e implementação dos TEEs, uma vez que estes não podem dar respostas institucionais aos problemas verificados;
Há dificuldades e morosidade no processo de operacionalização do decreto 6.861 com vários territórios ainda não definidos ou pactuados, inexistindo agenda para conclusão da implementação do decreto em todo o país;
Não há informações disponibilizadas qualitativas e quantitativas sobre o funcionamento dos TEEs pactuados, seus êxitos e dificuldades.
O instrumento de pactuação dos territórios não garante o compromisso dos gestores federais, estaduais e municipais, que continuam a atuar de forma desarticulada, gerando ações desencontradas e desconexas no mesmo território.

Recomendamos que:
O MEC estabeleça uma agenda para o processo de consulta, definição e pactuação de todos os TEEs, estendendo a consulta à totalidade dos povos indígenas;
O MEC crie uma estrutura administrativa com quadros permanentes para a gestão e coordenação dos TEEs, com previsão de cargos e realização de concurso público para CGEEI/MEC e com a criação da Diretoria de Educação Escolar Indígena, vinculada a SECADI;
O MEC estude e proponha um instrumento para a autonomia de gestão administrativa e financeira de cada território, por meio da constituição de Unidade Gestora própria para cada território pactuado, superando o atual modelo de financiamento restrito ao PAR;
O MEC crie uma linha de financiamento, via edital do FNDE, com recursos para o processo de implantação e funcionamento dos TEEs voltada para os instituições de ensino superior públicas e organizações da sociedade civil, indígenas e indigenistas;
O MEC constitua a Comissão Gestora Nacional dos TEES, conforme a Resolução 05/2012 CNE-CEB.

Brasília, 28 de maio de 2014.

Membros da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena



quarta-feira, 28 de maio de 2014

Seminário Internacional Acolhendo as Línguas Africanas


 
 
Discutir sobre a influencia da África no Brasil é reconhecer a necessidade de se refletir sobre história e os mitos que foram
estabelecidos em torno do nosso descobrimento e sobre conceitos cristalizados de raça, etnia, nação e nacionalismo.
O estudo dessas questões nos mostra a urgência de se recontar a história e dar voz aos cantos silenciados.

A realização do evento visa despertar na comunidade acadêmica brasileira o interesse pelos estudos das línguas e culturas
africanas mostrando a sua importância para a formação e sentido do Brasil.

APRESENTAÇÃO

A realização do evento visa despertar na comunidade acadêmica brasileira o interesse pelos estudos das línguas e culturas africanas mostrando a sua importância para a formação e sentido do Brasil.

O continente africano, esquecido e marginalizado por muitos, vem provocando o interesse de 
 inúmeros pesquisadores contemporâneos, sendo tomado como base para se estabelecer profundas  discussões sobre a diversidade étnica e o modo como as hierarquias de base étnico-raciais são reiteradas. Discutir sobre a influencia da África no Brasil é reconhecer a necessidade de se refletir sobre história e os mitos que foram estabelecidos em torno do nosso descobrimento  e sobre conceitos cristalizados de raça, etnia, nação e nacionalismo. O estudo dessas questões nos mostra a urgência de se recontar a história e dar voz aos cantos silenciados.

Conhecer a África é abrir os olhos a matrizes que interferem no nosso modo de ser e estar no 
mundo. Frequentemente associadas às fronteiras do preconceito, as culturas africanas foram relegadas, historicamente, a uma imagem pejorativa e destrutiva do escravo, sempre considerado inferior do ponto de vista cultural e,consequentemente, do ponto de vista social e humano. Essa visão ideológica e equivocada deu margem à emergência de estereótipos sobre  os negros através de um clichê aviltado e simplificado. Entretanto,hoje vários estudos são desenvolvidos voltando-se para a reversão dos estereótipos e a produção de identidades  minoritárias como construção sociais complexas e em continua transformação.

É preciso entender a sociedade brasileira a partir das diferenças e ler a historia não como 
uma totalidade fechada para que se possa tirar da clandestinidade muitos atos que foram camuflados pelo pensamento dominante europeu, pois a cultura, sejam quais foram as  características ideológicas ou idealistas das suas manifestações, é uma elemento essencial da História de um povo.( Amilcar Cabral).

Nesse sentido, o evento tem como objetivos:
- Discutir sobre a influencia da África no Brasil; através das Imagens e Linguagens.
- Discutir a importância desses estudos para o entendimento da formação e sentido do 

Brasil.
- Discutir a importância cultural entre a UNEB e diversos centros culturais e de pesquisa 

em africanias.
- Incentivar o interesse de estudantes e professores para participar de missões culturais

 em países africanos e ocupar postos de leitorados brasileiros já existentes em varias 
universidade africanas.

Programação e Inscrições:
http://www.siala.uneb.br/

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Calabouço 1968 - um tiro no coração do Brasil

O filme
 
O “Calabouço”, restaurante central dos estudantes, foi o cenário onde se desenrola o estopim das grandes manifestações estudantis que abalaram a ditadura instalada em abril de 1964 no Brasil.
 
Na tarde do dia 28 de março, o local estava repleto de estudantes, na maioria secundaristas, que reivindicavam a conclusão das obras do restaurante e melhorias na alimentação, quando foram reprimidos com violência pela Polícia Militar. Um tiro dado à queima roupa matou o jovem estudante Edson Luís, cujo corpo foi velado na antiga Assembleia Legislativa, que funcionava onde hoje é a atual Câmara de Vereadores, na Cinelândia, no centro do Rio.
 
Com cerca de 1 hora de duração, o documentário conta com depoimentos de personalidades que despontaram na época, como então estudante Vladimir Palmeira, que era presidente da UME (União Metropolitana dos Estudantes), o músico e compositor Sérgio Ricardo, autor da música “Calabouço”, entre tantas outras canções de protesto, o fotógrafo Evandro Teixeira, do Jornal do Brasil e a então estudante da Escola Nacional de Belas Artes e hoje jornalista Dulce Tupy, entre outros, o documentário resgata a memória do movimento estudantil, no momento em que detonou o processo de manifestações de massa que desembocaram na famosa Passeata dos Cem Mil.
 
FICHA TÉCNICA:
 
Calabouço 1968 - um tiro no coração do Brasil
Duração: 58min
Diretor: Carlos Pronzato
 
Exibição: Calabouço 1968 - um tiro no coração do Brasil, seguida de roda de debates com a presença do documentarista Carlos Pronzato. Entrada gratuita.
Data: 24/05
Horário: 17h
Local: Av. Brasil, 248, sala 1102. Santa Efigênia. 
Mais informações: http://betocineclube.blogspot.com.br / 8899-0201
 
 
Fonte: Via e-mail

VALDECK ALMEIDA DE JESUS ENTREVISTA O CACIQUE JUVENAL PAYAYÁ


JUVENAL PAYAYA É ENTREVISTADO POR VALDECK ALMEIDA DE JESUS

Juvenal Teodoro Payayá não sabe bem a cidade onde nasceu. É que as constantes emancipações dos distritos, gerando divisões políticas dos territórios torna o registro de nascimento dele em uma mentira, segundo palavras do próprio escritor. E ele explica: “veja: o “Maracaiá” aldeia quando nasci, era distrito do Morro do Chapéu, depois Miguel Calmon, depois Várzea Nova; Cabeceira do Rio onde fui concebido e criado, hoje é Utinga, mas, já foi Morro do Chapéu, e assim por diante. Portanto, resolvi simplificar as coisas e digo para todos que Sou chapadeiro, sou um cidadão nascido na Chapada Diamantina e pronto!
 
A primeira infância foi numa aldeia isolada, aos 12 anos, na maior comoção migratória interna do país, quando Payayá foi parar no Sul Maravilha – rumo ao sul. Aos 14 anos se tornou operário da construção civil, tecelão e metalúrgico. Depois de um concurso público [tipo reda] foi ser entregador de conta de água. Conheceu São Paulo mais que taxista e também muita gente famosa: Assis Chatobreand, Chacrinha, Mazzaropi, Hilário Torloni, vice governador de São Paulo e a família Poletto, a quem Juvenal diz dever amizade até hoje, devido a incentivo aos estudos. Entrou no supletivo Santa Inez, que era a sensação da época, onde também estudavam Boris Casoi, prof. Yromi Nakata, o ex deputado Paulo Kobayashe, o Pastor depois deputado Edgard Martins. Através de muito esforço, as orações de dona Ana e a sorte, em prazo curtíssimo terminava o “madureza” de primeiro e segundo graus. Prestou vestibular e passou ao mesmo tempo, na FMU para Direito e História na USP, advinha qual escolheu?
 
De operário da construção a operário do livro. Foi o primeiro despertar: não só os vendia, lia-os todos. Trabalhou na Theor,  Editorial São Paulo, Lello, enciclopédia Barsa, Revista Pedagógica Brasileira e, finalmente, de 1974 até 1993, na Editoria Ática, através da qual voltou para a Bahia, ajudando a estruturar a Scipione.
 
VALDECK: Quando e onde nasceu?
JUVENAL PAYAYÁ: Nasci no início do outono de 1945, dia 4 do mês 4,  pelas mãos de Soledade, parteira de fama do sertão, madrugada de uma quinta-feira chuvosa. O "Maracaiá", gato pintado em tupi, era uma aldeia isolada, hoje na confusão dos municípios não sei a qual cidade ela pertence, por isso limito-me a dizer que sou cidadão da Capada Diamantina. 94 dias depois desta data, acabava a Segunda Guerra Mundial e, para meu pai, eu vim trazer a paz.
 
VALDECK: Já conhece o restante do Brasil? E outros países?
JUVENAL PAYAYÁ: Sim, Bahia e Sergipe conheço praticamente todas as cidades, Minas, São Paulo e Paraná conheci muito bem seu interior. Tenho vontade de conhecer a grande selva amazônica, incluindo parte das Américas: Venezuela, Peru, ir a Machu Picchu, ver de perto o legado das civilizações Inca, Maia, o México. Claro que vislumbro conhecer a ilha de Ítaca, reino do grande Odisseu, ir a Espanha, especialmente Palos - de onde partiu Colombo - buscar a inspiração para melhor contar em versos o massacre dos ameríndios.
 
VALDECK: quando começou a escrever e onde?
JUVENAL PAYAYÁ: Meu primeiro artigo foi publicado em um jornal de Santo André-SP; era uma crítica mordaz à ditadura, o texto era ingênuo, panfletário, apesar da sinceridade não tinha qualidades, depois mandei outros que o jornal não publicou; escrevi para outros jornais nanicos da época: de Jacobina e de Minas, nunca guardei um recorte e, finalmente, na revista ArtPoesia. Meu primeiro livro foi os “Tupinikim – versos de índio”, os 1000 exemplares esgotaram em menos de dois anos, daí em diante lancei mais seis outros livros, em média de 400 exemplares por edição, menos “O Filho da Ditadura”, edição de 1000 exemplares, os outros estão esgotados.
 
VALDECK: Você escreve ficção ou sobre a realidade? Suas obras são mais poesias ou prosa? O que mais você gosta de escrever? Quais os temas?
JUVENAL PAYAYÁ: Se tiver de me considerar escritor, serei um escritor indígena, escrevo minhas inquietações em versos e prosa. Meu poema tem um tema: é a questão indígena. Além dos livros publicados, escrevi alguns ensaios e próximo de 400 poemas. Fora os intimistas, feito para a mulher amada, os demais são sobre a terra, o arco, a flecha, Tupã, a Chapada Diamantina; dedico muitos poemas aos opressores do povo indígena. O último livro “O Filho da Ditadura”, um dos filhos da ditadura é também um indígena.
 
VALDECK: Qual o compromisso que você tem com o leitor, ou você não pensa em quem vai ler seus textos quando está escrevendo?
JUVENAL PAYAYÁ: Claro que eu penso nas pessoas. Acho que desprezar o leitor é escrever para ninguém, o nariz em pé pode encharcar com a chuva. O que não faço é correr atrás de temas que agradem ao leitor, isso é tarefa para profissionais, jornalistas, novelistas e escritores de paradidáticos.
 
VALDECK: O que mais gosta de escrever?
JUVENAL PAYAYÁ: Gosto de escrever romances, porém, sinto no romance uma carga pesada, depende de tempo, planejamento, suporte teórico para as críticas, a correção, pesquisa, volumosa leitura e fôlego de nadador. Estou com um romance escrito há oito anos e não tenho fôlego para retomar seu enredo, ou seja, rever o papel de personagens por personagem, refazer as falas, os ambientes. No romance mudar a cor dos olhos de um personagem pode comprometer a sequência e episódios distribuídos por dezenas ou centenas de páginas. Não que escrever poema seja simples, acho o poema coisa do espírito, por isso independe da vontade do poeta, mesmo assim temo dizer que tenho algum poema pronto.
 
VALDECK: Como nascem seus textos? De onde vem a inspiração? E você escreve em qualquer hora, em qualquer lugar ou tem um ritual, um ambiente?
JUVENAL PAYAYÁ: Às vezes é no impulso, acordo pela madrugada para completar o texto e às vezes durmo sobre o texto. Gosto de silêncio, a calma da janela aberta contribui para a sensação de liberdade, me ajuda pensar.
 
VALDECK: Qual a obra predileta de sua autoria? Você lembra um trecho?
JUVENAL PAYAYÁ: Não gosto de tudo o que produzi, como acredito na ancestralidade, credito as coisas boas aos ancestrais, gosto do poema Temática: 

 
TEMÁTICA
Meu poema não vive
Em mundo puro e acabado,
Vedado a cimento, caiado,
Prefere a junta entre seixos;
 
Meu poema passa frio e fome
Come, é persistente;
Meu poema não acaba
Com o nascer do dia;
 
Antes do ponto final,
Estendo fundo o olhar
Para ver mais um poema
Enxaguando em janelas
 
E diante da ambiguidade
Delas, brota o verso na razão
Direta e pura como flecha
Que atinge o coração,
 
De algumas janelas acenam,
Outras acusam o poema
E se fecham na escuridão.
Meu poema tem um tema!
 
VALDECK: Seus textos são escritos com facilidade ou você demora muito produzindo, reescrevendo?
JUVENAL PAYAYÁ: Mudei muito, antes produzia como pão no forno, agora reescrevo até a exaustão, acabou a pressa, devo em parte a alguns leitores, é compromisso com o leitor.
 
VALDECK: Qual foi a obra que demorou mais tempo a escrever? Por quê?
JUVENAL PAYAYÁ: “Negócio na Periferia” é meu primeiro “longa folhagem”, 220 páginas. Em dois anos de atividade intensa, eu ia para as ruas construir os personagens, aquela coisa do empresário buscar na periferia o servente, seu mestre de obra e depois comer a filha dele, a índia urbana se prostituindo, isso me doía na alma, sabe; a trama e a ficção colidindo na minha cara, se completam; em o “Filho da Ditadura” trabalho sobre um tempo que convivi; estive na luta direta, entre pesquisas, imaginação, invencionice e muito quebra cabeça, lá se foram mais dois anos; diferente, no entanto é “A Prostituta de Alexandria” ou “DQVPM”, persigo o endereço do prostíbulo palaciano, a podridão nos bastidores dos palácios, a corrupção. Para completar o livro necessito de informações secretas, e precisava estar infiltrado no meio; este livro está pronto, mas  a história não acabou, há oito anos que trabalho nele.
 
VALDECK: Concluiu a faculdade? Pretende seguir carreira na literatura?
JUVENAL PAYAYÁ: Minha vida acadêmica foi penosa e tumultuada. Analfabeto até os 17 anos, fiz primário e madureza, aos 23 era estudante de História da USP, as responsabilidades pela vida me fizeram abandonar a USP, mas não a história, me reencontrei na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), completando Ciência Econômicas, depois na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), em educação, depois duas Pós e parei aí.
 
VALDECK: Qual o escritor ou artista que mais admira e que tenha servido como fonte de inspiração ou motivação para seu trabalho?
JUVENAL PAYAYÁ: Tenho dificuldades para enumerá-los. Gosto dos clássicos, Homero, Ovídio, a Bíblia, Camões, gosto de Kafka e Walter Benjamim, leio Marx e Marilena Chauí, Jorge Amado e Adonias, Murilo Mendes, Graciliano, Neruda, Fernando Sabino, detesto a apologia colonialista do Fernando Pessoa, sou amante da poesia baiana contemporânea, gostaria de ter tempo para frequentar as rodas e ler mais esta coisa boa. 
 
VALDECK: O que você acha imprescindível para um autor escrever bem?
JUVENAL PAYAYÁ: Ler, ler, ler e depois planejamento, e escrever, reescrever até cansar. Se eu não tivesse o planejamento e o volume de leitura – leio todos os dias - acompanhado da teimosia, não escreveria um bilhete, minha letra é ilegível, uso óculos, porém sou determinado, tenho método para ler. Quando pego um livro, primeiro conto as palavras, sei calcular o tempo que vou precisar para ler e persigo -, precisei de 39 horas para ler Ulisses, de Joice -, obedecendo ao plano; se nada me interromper, cumpro a tarefa no tempo previsto.
 
VALDECK: Você usa o nome verdadeiro nos textos, não gostaria de usar um pseudônimo?
JUVENAL PAYAYÁ: Juvenal é meu nome de batismo, Payayá de meu povo. Quando descobri que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) promoveu a extinção dos Payayá adotei o nome, incorporei na alma, ou seja, Payayá é mais que um nome, muito além do pseudônimo, é o nome de um povo resistente, o povo indígena Payayá.
 
VALDECK: Como foi a tua infância?
JUVENAL PAYAYÁ: Nasci no coração da Chapada Diamantina, meu pai era agricultor, aprendeu ler sozinho, e lia obstinadamente com uma lasca de candeia embebida em cera de abelha, muita luta pela vida, mesmo assim fui feliz até os onze anos, quando a ilusão do sul-maravilha me arrematou de meu chão.
 
VALDECK: Você é jovem, gasta mais tempo com diversão ou reserva um tempo para o trabalho artístico?
JUVENAL PAYAYÁ: Desde a juventude fui um cara engajando, tive a vida dividida entre o trabalho intenso, a família, as questões políticas, as questões sociais e a literatura, porém, gosto de diversão, gosto de dançar e viajar, uma roda de Toré, um bom papo ao redor de uma mesa, odeio a fome, “tô” sempre pronto pra matar uma.
 
VALDECK: Tem um texto que te deu muito prazer ao ver publicado? Quando foi e onde?
JUVENAL PAYAYÁ: No lançamento de “Os Tupinikim” fiquei com cara de mãe parida, muitas alegrias. Li com satisfação o “Poemas para os Clássicos”, traduzido para o italiano; o poema “Seios”, declamado na Cantina da Lua; a comunidade brasileira na Alemanha publicou “Para Além do Borjador”, um texto significativo. A vaidade é pior que o câncer, contamina!
 
VALDECK: Você tem outra atividade, além de escritor?
JUVENAL PAYAYÁ: Sou professor, lecionei matemática, filosofia, sociologia, economia e pesquisa operacional. Para um índio da Cabeceira do Rio é uma prova que ao índio basta primeiro garantir a unidade com auto sustentabilidade do seu povo e acesso às oportunidades.
 
VALDECK: Você se preocupa em passar alguma mensagem através dos textos que cria? Qual?
JUVENAL PAYAYÁ: O preconceito é um fel contra o povo indígena, é a morte, a pior lástima. O pecado original. A ganância. Que diríamos de um neto que rejeita seus avós? Pois é esta a sociedade em que vivemos! Digo desta sociedade que se apossou das terras alheias, as terras das Américas, finge que nada sabe sobre os crimes hediondos, por motivos torpes praticados por seus antepassados. Meus escritos têm objetivos de relatar as dores que estão dentro do coração dos vencidos.
 
VALDECK: Qual sua Religião?
JUVENAL PAYAYÁ: Pelos relatos bíblicos Cristo sofreu o preconceito de um povo - que se dizia povo de Deus – foi desprezado até a morte horrenda, mas sua imagem vive. Com este acreditar que luto. É a mesma arma preconceituosa que aplicam contra os índios, o ódio, a ira, a destruição, a falsidade, a violência, tudo em nome de Deus, ou do diabo!
Gosto da mensagem do cristo através da natureza... talvez Xamã.
 
VALDECK: Quais seus planos como escritor?
JUVENAL PAYAYÁ: Ser reconhecido em vida como escritor indígena, aquele que se dedica à causa de um povo dado como exterminado.
 
(*) Valdeck Almeida de Jesus é escritor, poeta e editor, jornalista formado pela Faculdade da Cidade do Salvador. Autor do livro “Memorial do Inferno: A Saga da Família Almeida no Jardim do Éden”, já traduzido para o inglês. Seus trabalhos são divulgados no site www.galinhapulando.com
Valdeck Almeida de Jesus
Enviado por Valdeck Almeida de Jesus em 27/12/2011
Alterado em 27/12/2011
 

Mobilização Nacional Indígena de 26 a 29 de Maio




Povos indígenas de todo o país reúnem-se na capital federal para realização de atos e manifestações contra os ataques aos seus direitos garantidos pela Constituição Federal
 
Brasília, 23 de maio de 2014 – Povos e organizações indígenas de todo o País promoverão manifestações e eventos em defesa de seus direitos e de suas terras, em Brasília, na semana que vem. As atividades acontecem de segunda a quinta-feira (de 26 a 29 de maio), como parte da Mobilização Nacional Indígena. Na quinta (29/5), às 9h, está confirmada uma audiência pública, no auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados.
 
Os protestos ocorrem num cenário de ataque generalizado aos direitos indígenas, em especial os direitos territoriais, da parte de vários setores do governo e de um conjunto de atores políticos e econômicos capitaneados pela bancada ruralista no Congresso Nacional.
 
Um dos principais objetivos da mobilização da semana que vem é impedir a aprovação da série de projetos contra os direitos indígenas em tramitação no parlamento, como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que pretende transferir aos congressistas a atribuição de aprovar a demarcação das Terras Indígenas (TIs); o Projeto de Lei (PLP) 227, que visa abrir essas áreas à exploração econômica; o PL 1.610, que regulamenta a mineração nas TIs, entre vários outros. Também serão alvos dos protestos, entre outras medidas do governo, a proposta de alteração do procedimento de demarcação das TIs do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e a Portaria 303 da Advocacia-Geral da União (AGU), que objetiva generalizar a todas as TIs as condicionantes definidas para a TI Raposa Serra do Sol (RR), contrariando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Na prática, todas essas propostas do Executivo e do Legislativo pretendem paralisar definitivamente os processos de demarcação, já suspensos pelo governo federal.
 
Enquanto isso, a tramitação de projetos importantes para consolidar os direitos indígenas e que são bandeiras do movimento indígena, como o Estatuto dos Povos Indígenas e o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), está paralisada há anos nos corredores do Congresso, sem qualquer avanço. A Mobilização Nacional Indígena também defende a sua aprovação dessas duas demandas.
 
“Vivenciamos uma vísivel pactuação dos poderes do Estado e dos representantes do capital contra os direitos indígenas. Está em curso uma virulenta campanha de criminalização, deslegitimação, discriminação, racismo e extermínio dos povos indígenas”, alerta Sônia Guajajara, da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Ela destaca, como exemplos dessa campanha, as prisões arbitrárias de integrantes do povo Kaingang no Sul do País, dos cinco tenharim em Humaitá (AM) e, na Bahia, do cacique Babau Tupinambá.
 
Como parte da mobilização, está sendo relançado o site A República dos Ruralistas, que mapeia os principais integrantes da bancada que representa os grandes proprietários do agronegócio no Congresso. A página passou por uma atualização, com a inclusão de novos perfis de deputados federais e senadores.

A Mobilização Nacional Indígena é promovida pela Apib, com apoio do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Instituto Socioambiental (ISA), Greenpeace, Instituto de Educação do Brasil (IIEB), entre outras organizações indígenas e indigenistas. 
 
Comitê de Comunicação da Mobilização Nacional Indígena
 
#Oswaldo Braga de Souza (ISA) – (61) 9103-2127 / 3035-5114 /oswaldo@socioambiental.org
#Tatiane Klein – (ISA) – (11) 3515-8957 / tatianeklein@socioambiental.org
#Renato Santana (Cimi) – (61) 9979-6912 /editor.porantim@cimi.org.br
#Patrícia Bonilha (Cimi) – (61) 9979-7059 /imprensa@cimi.org.br
#Helena Azanha (CTI) – (11) 9 7476-8589/ helena@trabalhoindigenista.org.br
#Nathália Clark (Greenpeace) – 61 9642-7153 /nathalia.clark@greenpeace.org
#Letícia Barros (IIEB) – (61) 3248-7449 /  leticia@iieb.org.br
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Conselho Indigenista Missionário
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Fonte: Via e-mail.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Povos indígenas promovem Copa das Árvores

Povos indígenas promovem Copa das Árvores

Por 22 de maio de 2014 às 7:51
Nem estádios, nem grandes delegações ou importantes jogadores de futebol. No dia seguinte do último jogo da Copa do Mundo da Fifa, quem entra em cena é a Copa das Árvores.
O evento, que será realizado de 10 a 17 de julho, na Aldeia Kuntamanã,  no município de Marechal Thaumaturgo,  no Acre, reunirá diferentes etnias e ainda a comunidade extrativista e organizações governamentais e civis, para discutir  a importância da floresta dentro da concepção das culturas ancestrais.
Divulgação
“Para nós, essa é a copa da vida, pois a floresta é a morada de milhares de seres viventes”, diz Haru Kuntamanã, liderança indígena e também um dos organizadores do evento.
Compostas de diversas atividades, as rodadas da Copa das Árvores girarão em torno de cinco eixos diferentes: sustentabilidade, cultura, ambiente, espiritualidade e medicina.
Na parte de sustentabilidade, haverá uma feira de conhecimentos tradicionais, comércio justo e economia solidária para compartilhar o conhecimento dos povos das florestas na questão da soberania alimentar.
As manifestações tradicionais das comunidades extrativistas e também dos indígenas, compõem a parte cultural da festa. No quesito sobre o ambiente, será aberto um diálogo sobre as potencialidades da floresta e o uso sustentável dos recursos naturais, como a implantação da agrofloresta e formas naturais de plantio.
Divulgação
Para ilustrar o tema da espiritualidade, os anciões das comunidades vão explicar sobre a cosmologia indígena e a contextualização das plantas de poder. A sabedoria do uso da ervas para a cura será o tema da eixo medicinal.
“É claro que teremos também atividades esportivas como campeonato de arco e flecha, cipó de força, arremesso de lança e até jogos de futebol”, conta Haru. “Nós gostamos de futebol, mas para nós é diferente, porque ele não é prioridade. O que mais importa para gente é preservar a floresta, nossa casa sagrada.”
Fonte: https://queminova.catracalivre.com.br/2014/05/22/povos-indigenas-promovem-copa-das-arvores/

terça-feira, 20 de maio de 2014

POLITICA INDIGENISTA - UM COMPROMISSO GOVERNAMENTAL




Já estamos quase chegando perto das campanhas politicas para a Presidência da República, mas elas já estão sendo trabalhadas em vários níveis como os acordos políticos e os ajustes de marketing.

Nós Povos Indígenas, as primeiras nações do Brasil, não ouvimos nenhuma menção por exemplo, nos programas partidários que passaram recentemente nas Televisões. 

Isso nos deixa muito apreensivos, afinal somos um milhão de guerreiros e guerreiras protegendo 15% do território nacional com nossas casas, nossas famílias e nossos ecossistemas.

É nesse celeiro do bem viver que estão grandes matérias primas para a modernidade, além de águas potáveis e biodiversidade.

Nós Indígenas temos um grupo de pensadores pensando o Brasil como potência mundial, mas dentro de um equilíbrio e de respeito mútuo entre pessoas de diversas origens e costumes, formas de comer e beber, tradições culturais e principalmente modelos de desenvolvimento.

Nós Indígenas sabemos saborear o peixe que vem dos rios de forma abençoada e gratuita, assim como sabemos que tem gente que saboreia comidas caras nos restaurantes e até gente do mundo do branco, que não tem nada prá comer.

Acreditamos que os Planos de Governo do próximo gestor do Brasil na Presidência da República, deve estabelecer uma relação de trabalho com os Povos Indígenas sim.

Os conflitos e os problemas que nos cercam como povos indígenas não foram criados por nós, mas nós queremos participar das buscas de soluções.

Não queremos que o nosso Brasil, a nossa Terra seja divididas em amigos e inimigos dos Índios!

Marcos Terena - é fundador do primeiro movimento indígena no Brasil

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M. Marcos Terena

Fonte: Via e-mail da RCPT

sexta-feira, 16 de maio de 2014

O exímio paraquedista, Edgard Otácilio de Oliveira, saltou para o Eterno!

Edgard escudado por livros, uma das suas paixões.

Edgard entre amigos de vários lugares na cidade de Valença

Livro de sua autoria

Livro de sua autoria

Livro de sua autoria.
Capa de RitaTereza da Silva Oliveira, sua mãe.

O nosso estimado - e sempre será - Edgard Otacílio de Oliveira como exímio paraquedistas inverteu as ordens de descer e subiu nesta noite para o eterno! Ele realmente era um revolucionário! Por certo se juntará - definitivamente aos nossos ancestrais indígenas!

Fará falta mas estará no Sempre!!!

Numa próxima postagem, pois esta me pegou em cheio, apresento aqui um pouco do meu amigo que o tratava como abaeté. Um pouco do seu tom, seus livros...


 Bure'du po'o, Edgard Otacílio de Oliveira!
(Língua Kiriri, também falada pelos Payayá.
Tradução em Português: “Muito obrigado!”).


Fonte da foto (adaptada): http://2.bp.blogspot.com/-PcVFK7TkOSk/UvKFJaE8OPI/

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Fonte da foto de Edgard em nosso meio (em Valença (BA): http://ademarioar.blogspot.com.br/2010/05/fronteira-indigena.html

segunda-feira, 12 de maio de 2014

A improbidade que mata os Yanomami


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A improbidade que mata os ianomâmis
Enquanto Comissão da Verdade estuda crimes da ditadura, atuais mortes são alvo de investigação
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LEÃO SERVA
A improbidade que mata os ianomâmis
Enquanto Comissão da Verdade estuda crimes da ditadura, atuais mortes são alvo de investigação

Quando a Comissão da Verdade sobre a ditadura militar inicia a análise do quase genocídio dos ianomâmis nos anos 1970 (na abertura da rodovia Perimetral) e 1980 (com a massiva invasão garimpeira), um novo aumento das mortes é tema de uma investigação atual.

Os índios do extremo norte voltam a padecer de altas taxas de mortalidade, vítimas de uma ou mais doenças típicas da sociedade contemporânea, como incompetência administrativa e, talvez, corrupção, como suspeita o Ministério Público.

Ao contrário de povos indígenas menos famosos, que sofrem com a falta de verbas para saúde, na área ianomâmi os gastos do Ministério da Saúde subiram quase seis vezes nos últimos dez anos (2004-2013).

Mas, no mesmo período, a incidência de malária subiu de 41,8 por mil habitantes para 70,6. Enquanto o Brasil se tornava um país rico, a mortalidade infantil desses índios atingia o índice de 113 por mil nascidos vivos em 2013 --semelhante aos africanos Serra Leoa e Somália, assolados por guerras (o Brasil tem 19,6, conforme o IBGE).

A degradação dos índices de saúde entre os ianomâmis motivou um protesto no início do ano, forçando a renúncia da coordenadora do Ministério da Saúde em Boa Vista (RR), Joana Claudete Schuertz.

Desde então, a substituta interina segue no posto. Perguntada por este colunista se os problemas se deviam a falta de dinheiro, Maria de Jesus do Nascimento disse: "Não, dinheiro não falta... Foi problema de gestão, mesmo".

Não falta dinheiro, mas faltam médicos, equipamentos, medicamentos. Por isso, quando uma pessoa fica doente, o remédio é mandá-la para Boa Vista de avião.

A medicina preventiva é sempre considerada estratégia fundamental para áreas indígenas. Era o que pregavam as ONGs conveniadas com o governo, a partir de 2000, para gerir a saúde na área ianomâmi. Por quatro anos, elas receberam dinheiro público para contratar os agentes comunitários de saúde e médicos, implantar postos, comprar remédios, fazer vacinação. Os índices melhoraram, mas sua autonomia irritava funcionários públicos, que perdiam funções.

Após a eleição de Lula, com apoio dos sindicatos do funcionalismo, o discurso corporativista se fortaleceu. Ganhou também apoio de setores conservadores, que viam influência esquerdista e estrangeira nas ONGs. O gasto anual com a saúde ianomâmi (cerca de R$ 14 milhões, atualizados) era apontado como exagerado. O ministério voltou a centralizar a política.

Dez anos depois, com um orçamento real seis vezes maior, a saúde dos índios só piora. Um gasto do ministério que era muito atacado pelas novas autoridades que chegaram ao poder em 2003 foi radicalizado: os custos com aviões para transportar doentes da Terra Indígena para Boa Vista. Em 2013, R$ 21 milhões foram para a conta de duas empresas de aviação, exatamente metade dos R$ 42 milhões despendidos pelo Ministério da Saúde em ações na área ianomâmi.

O Ministério Público Federal faz investigação para apurar o que degrada a situação. Problemas de gestão, quando matam, também são improbidade administrativa. A Procuradoria quer saber, também, detalhes sobre os gastos com aviões, pois os números são grandes demais para retratar apenas incompetência. Talvez reflitam esperteza.

Fonte: Via e-mail do Grupo da ANAIND.